domingo, julho 08, 2007

Censura na Porcalândia

« Numa entrevista dada a António Ferro, em 1932, ao assumir a presidência do Conselho de Ministros, Salazar disse ao seu interlocutor que compreendia a irritação provocada pela existência de Censura, dado que não havia “nada que o homem considere mais sagrado que o seu pensamento e do que a expressão do seu pensamento” - Salazar contou que ele próprio já havia sido “vítima da censura”, confessando que chegara mesmo, por isso, “a ter pensamentos revolucionários”. Hipocritamente, afirmou que o aparelho de Censura era “uma instituição defeituosa, injusta, por vezes, sujeita ao livre arbítrio dos censores, às variantes do seu temperamento, às consequências do seu mau humor”.

No entanto, à pergunta de Ferro, por que não revogava então a Censura, esclareceu que não o faria, pois não considerava “legítimo, por exemplo, que se deturpassem os factos, por ignorância ou por má fé, para fundamentar ataques injustificados à obra dum governo, com prejuízo para os interesses do pais”. Nesses casos justificava-se a censura, «como elemento de elucidação, corno correctivo necessário». Observando que a imprensa outrora existente em Portugal dava “a triste imagem dum saguão: intrigas, insultos, insinuações, pessoalismos, provincianismos, baixa intelectualidade”. Salazar disse que o objectivo de um jornal era ser “o alimento espiritual do povo” e, por isso, devia “ser fiscalizado como todos os alimentos”.

Para evitar, porém, “o mais possível”, o “trabalho da censura”, o novo presidente do Conselho afirmou estar a pensar criar "um bureau de informações a que os jornais" poderiam recorrer; para se munirem, de elementos necessários à análise, e até à crítica, da obra do governo". A criação de tal gabinete não acabaria, no entanto, com a Censura, dado que, segundo Salazar, esta também tinha um "aspecto moralizador", ao intervir necessariamente nos “ataques pessoais e nos desmandos de linguagem”. Além desse aspecto "moralizador", a Censura também era chamada a intervir "no aspecto doutrinário", pois ela acabava por ser a “função natural dum regime de autoridade”, ao ter que actuar contra a doutrina subversiva. À sugestão de Ferro de que isso poderia ser resolvido com uma lei de Imprensa, Salazar cha­mou a atenção para o facto de os tribunais não darem "um rendi­mento necessário em delitos dessa natureza". O certo é que, pouco tempo depois de assumir o seu novo cargo, Salazar emitiu, em 23 de Dezembro de 1932, uma circular, a determinar a reorganização geral dos Serviços de Censura.

Noutra ocasião, ainda em conversa com António Ferro, Salazar repetiu a afirmação de que a Censura constituía "a legítima defesa dos Estados livres, independentes, contra a grande desorientação do pensamento moderno, a revolução internacional da desordem" ».

Irene Flunser Pimentel (2007), “A censura”, in João Madeira, Luís Farinha, Irene Flunser Pimentel, Vítimas de Salazar, Esfera dos livros, Lisboa


Qualquer semelhança com a realidade actual na Porcalândia é pura coincidência.

Nota de comentário crítico à prosa- Para quê estragar um trabalho documental válido com advérbios de modo como "hipocritamente" que apenas estragam o efeito? Para quê adjectivos e advérbios destes? O leitor é burro? É pena.

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