quarta-feira, março 28, 2007

Retrato social de Portugal

Talvez seja bom o pobinho verificar o que vai perder nos cuidados de saúde, é que parece nem ter reparado no que ganhou depois de Abril de 1974 ou já esqueceu. Nota positiva para a RTP, ontem, com o programa de António Barreto em horário nobre, espero que mantenha a qualidade até ao último episódio, não cedendo à tentação da propaganda do PS. Foi o programa que precisávamos depois do trauma da noite de domingo. Dados sobre a saúde dos Portugueses antes e depois do 25 de Abril, logo a abrir o programa, gostei muito.
A sensação fica de que em Portugal ainda há uma clivagem não explicitada a respeito do passado. Silenciou-se a grande fractura e ela vai saindo aqui e ali. Quem perdeu com o fim do regime anterior? Perdeu quem tinha o regime a trabalhar para si, o regime da polícia na fábrica a segurar os salários de miséria, esses que acharam que perderam eram mais do que se pensa, muitos eram pequenos empresários, não eram só as 6 famílias , na explicação simplista do PCP. Perdeu quem tinha o regime como o grande defensor das propriedades ou carreiras construídas no ultramar, o tal regime que ia enviando à força, durante 13 anos e mais não foi porque entretanto era Abril de 74, a juventude masculina a defender "o império", ou seja morrer por eles. São fracturas profundas, feridas insanáveis. A raiva sai aqui e ali no ódio mesquinho, cretino e ignorante ao outro, ao político em geral sem ver quem é quem, ao imigrante em geral, ao funcionário público em geral, ao profissional disto e daquilo que estiver na berlinda na altura e que pareça ao pobinho inbejoso estar melhor que ele, o ódio ao doutor em geral, à excepção de um ou dois eleitos para serem os doutos e honestíssimos salvadores da pátria. Ignorar esta tendência do pobinho é, no mínimo, perigoso. E há por aí um PNR agitando umas bojardas, ignorá-lo é estúpido. E vamos ver a evolução do discurso do CDS. Mas do lado dos que perderam e do lado dos que se lembram do que ganharam, a raiva às vezes tem que sair, espero que fiquemos assim, as diversas raivas de um e de outro lado expressando-se por meio da palavra, do argumento, da imagem, da caricatura, do telemóvel a votar concursos, e, claro, também por meio da manifestação pública pacífica, todas elas formas legítimas de expressão em democracia.

Espero muito interessada pelos próximos episódios de retrato social de Portugal. Espero que António Barreto mostre também isso, o contraste entre o Portugal amordaçado, acorrentado, escravizado, analfabeto e brutificado (desculpem os lugares comuns deste post, mas tem que ser) e o Portugal de hoje, apesar de tudo, muito diferente, com melhor qualidade de vida em todos os sentidos , um Portugal europeu, escolarizado (apesar de não muito) e, sobretudo, livre.

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