quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Antena1: provas globais

É interessante ver como agora todos falam de rigor, mesmo aqueles que conduziram o sistema educativo ao facilitismo extremo. São os mesmos senhores que estão e sempre estiveram no ministério da Educação. Conseguem fazer piruetas argumentativas para provarem que sem provas globais e sem exames o ensino é mais rigoroso. Mantêm os exames a Português e Matemática porque não têm coragem de acabar também com esses, uma vez que sabem que os mesmos foram bem recebidos por muitos sectores da educação, quando Justino os introduziu. São aqueles senhores e senhoras os que têm mantido o sistema educativo tal como ele está, há 30 anos, sem rigor senão nos papelinhos cheios de cruzinhas e espacinhos que os profs têm que preencher. Para esses senhores , os papelinhos para os docentes preencherem é que são o "rigor". Com o objectivo de obterem na secretaria o que tornaram impossível conseguir na sala de aula, para "aumentarem" o "sucesso escolar" tornaram quase impossível reter alunos. Para os docentes, passá-los é o melhor que têm a fazer, se não quiserem que uma montanha de papéis e de reuniões inúteis se abatam sobre o seu horário já sobrecarregado de muitos papéis e de muitas reuniões inúteis. O professor tornou-se um escrevinhador de papelada, sobretudo no ensino básico. Alguns pais já vão à escola pedir para que retenham o seu filho mal preparado, mas nem sempre conseguem....
Mas tudo isto é conhecido e contestado por muitos há muitos anos, os resultados estão aí, a mostrar quem teria razão...
O ensino obrigatório determina que não é facultativo ir à escola , não significa que é dado a todos o diploma do ensino básico de forma administrativa. Retidos ou não, os alunos na escolaridade obrigatória devem estar na escola, não são delas expulsos quando são retidos. Eles abandonam porque o sistema não dá alternativas, com o ensino profissional e profissionalizante. O apoio, nos últimos anos, das equipas ministeriais à criação de cursos alternativos é dos poucos sinais positivos. Claro que nesse tipo de ensino as verbas vêm em grande parte da Europa....
Provas globais para selecção para o ciclo seguinte são necessárias, a meu ver, e de preferência nacionais. Mas não da forma como têm sido feitas, com peso insignificante, como se fossem mais um teste. Talvez seja de bom senso neste ano realizar só as provas de Português e Matemática num país de incerteza, do mais ou menos também quanto a exames e regimes de avaliação: durante o ano lectivo ninguém sabe como vai ser no final, vai-se vendo, vão-se esperando decisões de cima, vão se tomando decisões quando os de cima mandam que sejam os de baixo a decidir!
Não deveria ser permitido a ninguém inscrever-se num curso do 10º ano regular, na área de humanidades, se chumbado a Português ou na área de Ciências, se chumbado a Matemática. O problema no ensino em Portugal é, entre outros, o da falta de sentido da realidade. Os jovens só muito tarde tomam conhecimento da importância da formação exigente. São entretanto mantidos num "engano de alma", na protecção da escola e das notas fáceis. Stress escolar? Há também, por estranho que pareça . São as pontas extremas que determinam o que se passa na escola. Os filhos de pais com elevada escolarização mantêm os níveis de exigência, não porque estejam muito interessados em ver obstáculos na sua vida escolar (embora saibam que há mínimos necessários, apesar de tudo) mas sobretudo porque os jovens com certo nível de linguagem, habituados muito cedo ao raciocínio lógico-dedutivo, têm depois extrema facilidade em atingir os mínimos. O stress deriva de alguma exigência em casa a respeito das notas. Passando o dia na escola é natural que alguns alunos sintam que lhes falta o tempo para estudarem a extrema diversidade de matérias que lhes passa pelo dia... daí talvez, o stress. Não é a escola nem o sistema de ensino que determinam os padrões. São esses alunos e o apoio que recebem em casa que ainda mantêm a escola com algum rigor. Os profs há muito que têm vindo a depor armas...É que, se nem esses alunos privilegiados conseguissem atingir os objectivos, a escola recuaria ainda mais na exigência. Mas tem vindo a recuar ano após ano... não tanto como alguns gostariam quando vêem os seus filhos, com tudo em casa, mesmo assim "chumbarem". O ambiente entre alunos resulta do que a/s escola/s faz/em aos comportamentos transgressores. Quanto a isso é o que se sabe ou se julga saber pelo que transparece aqui e ali. Qualquer estudo externo ao sistema sobre disciplina ou segurança é atacadíssimo pelos ilustres representantes da pedagogia do facilitismo, como se viu quando a DECO publicou o seu inquérito sobre insegurança na escola. Muito interessante será ler o estudo da unicef "Child poverty in perspective: an overview of child well being in rich countries". Embora seja estranho que a Unicef agora se dedique ao estudo do bem estar nos países ricos, não deixa de ser esclarecedor dar uma olhada ao relatório. Mas ninguém terá tempo para isso: nem para ler, ponto por ponto, o ECD quanto mais estes estudos..É verdade, nem para isso nem para resistir à humilhação: a cabeça na areia, a cabeça baixa, a obediência canil são, de facto, a resposta de muitos....

Nota: sem querer ofender a espécie canina que tem acima de tudo uma qualidade: a lealdade, mesmo quando ataca, fá-lo de frente e olha nos olhos ...

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